terça-feira, 2 de junho de 2009

Insomnia - Um Ensaio sobre a Insónia

Olá pessoal,
Imagino que já todos vós tenham passado por noites em branco, em que, não importa quantas horas estejam deitados, quantos comprimidos tomem, quantos carneiros contem ou quantas voltas na cama dêem, não conseguem adormecer.
Bem, minha gente, posso dizer desde já que fazer um blog pode ser uma boa maneira de ocupar o tempo, tomar demasiados comprimidos pode matar, contar carneiros é aborrecido e que quando pararem de dar voltas na cama e adormecerem, o despertador toca e têm que se levantar.
A insónia é caracterizada pela falta de sono ou pela dificuldade em adormecer por vários dias e pode ter diferentes durações (transitória - devido a stress ou excitação; curta - alguns dias, devido a stress grave despoletado por problemas emocionais como o luto; e longa - pode durar semanas, relacionada com depressão, stress crónico e abuso de drogas). Contudo, o resultado é sempre o mesmo - na manhã seguinte andamos cansados, irritáveis e agressivos.
O cinema encontrou nestes sintomas algumas das personagens mais memoráveis da sétima arte.
Insomnia (de Christopher Nolan, 2002)
Em Insomnia, Al Pacino interpreta um detective que é enviado para uma vila do Alasca para investigar o homicídio de uma rapariga. Enquanto tenta capturar um suspeito, dispara acidentalmente contra o seu colega, matando-o. Em vez de assumir a culpa, diz que foi o fugitivo que o matou, o que apenas vai ampliar a complexidade emocional e o sentimento de culpa pelo seu acto. Entretanto, uma detective local (a duplamente galardoada Hillary Swank por Boys Don't Cry e Million Dollar Baby) conduz também ela uma investigação sobre o homicídio do colega de Al Pacino. Apesar de não parecer haver provas de que este seja o verdadeiro culpado, e da jovem detective o admirar e não desconfiar do seu alibi, Al Pacino começa a sofrer das mais terríveis insónias, numa cidade onde, devido ao interminável Sol da Meia Noite, o dia não cede a vez à noite. Tudo isto começa a causar-lhe alucinações e, para piorar, o culpado do primeiro homicídio (Robin Williams) tenta entrar em contacto com ele e contar-lhe pormenores do seu crime. Um dos melhores filmes de Christopher Nolan, realizador de Batman-O Início e O Cavaleiro Negro, Memento e The Prestige.
O Maquinista (de Brad Anderson, 2004)
O Maquinista, interpretado pelo soberbo Christian Bale (que se revelou ainda em criança com o filme de Spielberg - Império do Sol, e que agora é uma estrela de acção graças a Batman e ao último capítulo do Exterminador Implacável, que está agora nos cinemas), é um homem anorexico (o actor emagreceu até ao ponto que se pode observar na foto) que está a morrer de insónia crónica, não dormindo há mais de um ano. Progressivamente, começa a duvidar da sua própria sanidade, conforme os mais estranhos acontecimentos se vão dando na sua vida. Na fábrica, a fadiga pesa-lhe e os acidentes acontecem. Entretanto, é atormentado por um estranho colega de trabalho, deformado, que mais ninguém acredita que exista. E estranhos post-its vão aparecendo colados ao seu frigorífico, com o jogo da forca, para que este descubra qual a palavra escondida. Uma prostituta e uma empregada de bar são as únicas personagens que se preocupam com ele e as suas cordas de salvação, sendo também arrastadas para uma trama cada vez mais complexa e intrigante em que a realidade e a alucinação se confundem em pura luz do dia.
Clube de Combate (de David Fincher, 1999)
Este filme é, sem a menor dúvida, o meu filme preferido, o melhor que eu já vi na minha vida. Edward Norton é um homem que sofre de insónia crónica. Uma autêntica bomba-relógio à procura de algo que o resgate da sua vivência anónima e rotineira. É ele próprio quem relata a história, enquanto começa a infiltrar-se em grupos de entre-ajuda para doentes de cancro (especialmente os de cancro testicular, onde conhece uma outra infiltrada, Marla Singer, interpretada magistralmente por Helena Bonham Carter...). E é numa das suas muitas viagens de negócios que conhece Tyler Durden (Brad Pitt), um exêntrico vendedor de sabão feito a partir de gordura humana, roubada de clínicas de lipo-aspiração. Juntos formam um Clube de Combate ilegal, onde homens na mesma situação que ele encontram um escape para a desilusão da vida real. Este filme é uma revolução contra a apatia do socialmente correcto, contra o maniqueísmo de uma vida rotineira, contra o homem resignado a ser um autómato. É uma ode ao excêntrico, ao anormal, ao socialmente incorrecto, à desilusão da vida, dos sonhos não realizados, das ambições frustradas. E o criador desta revolução é um homem que não consegue dormir e embarca na loucura para combater aquela que ele acha que é a sua verdadeira doença.
A Estranha em mim (de Neil Jordan, 2007)
Este é um caso de insónia mais ligeira que as anteriores, mas com consequências nada menos importantes. Jodie Foster é Erica Bain, locutora de uma rádio de Nova Iorque, que percorre apaixonadamente as ruas dessa cidade, ouvindo os seus sons, a suas histórias, vendo e testemunhando "all the beauty and ugliness that is disappearing from our beloved city." Uma noite, após ter estado a tratar dos preparativos para o seu casamento com o seu apaixonado noivo, o casal é atacado por um gangue enquanto passeiam o cão no Central Park. Erica é deixada em coma, o cão é roubado e o noivo morre. Após recuperar a consciência e saber o que aconteceu, Erica é assumada pela dor do luto, pela injustiça e pela sede de vingança. Não consegue dormir. Durante a noite, vagueia pelas ruas de Nova Iorque, ruas que nunca antes tinha percorrido. Vendo-se demasiado insegura e desprotegida, procura obter uma arma ilegalmente. E assim que vê a sua vida ameaçada novamente, faz justiça pelas próprias mãos. Torna-se uma vigilante. Uma justiceira. E a sua insónia não desaparece, assim como a sede de vingança e do sentimento de culpa.
Pesadelo em Elm Street (de Wes Craven, 1984)
Finalmente, apenas um clássico que eu não podia ignorar. A história já é conhecida. Várias crianças que vivem em Elm Street começam a sonhar com um homem deformado, com facas em vez de dedos. Lentamente, começam a morrer durante o sono, um a um, e a protagonista descobre que têm que se manter acordados para ficarem a salvo, e a única forma de cortar o mal pela raiz é trazer o monstro para o mundo real, pois nos sonhos (ou pesadelos) ele é invencível. Wes Craven, mestre do terror, inventou esta história a partir de incidentes verídicos decorridos com três jovens cambodjanos, sobreviventes do genocídio de Pol Pot (?), em que morreram após terem horríveis pesadelos. Aparentemente, primeiro, eles começavam por ter horríveis pesadelos, recusavam-se a dormir durante vários dias, até que acabavam por adormecer devido à exaustão. Acordavam então aos gritos e morriam com um ataque cardíaco. O último caso (destes três) usou vários métodos para se tentar manter acordado, (alguns dos quais utilizados pelas personagens do filme, como ter um termo com café, para ir bebendo às escondidas) e tentou persuadir os pais a acreditarem nele, quando dizia que morreria se adormecesse.
E assim termino o meu ensaio sobre a insónia. Deixo ao vosso critério descobrir o que está por detrás das insónias de cada um. Esta pequena lista de filmes é sugestiva de algumas razões.
Será que o meu vizinho assassinou alguém? Será que o meu colega de trabalho é tão louco quanto parece e sofre de alucinações? Será que a mulher que me serve o café se prepara para destruir as bases da sociedade? Será que o condutor deste autocarro está de luto? Será que aquele tipo com as olheiras não dorme devido a uma insaciável sede de vingança? Ou será que a Nancy não dorme, porque tem medo de morrer?

1 comentário:

  1. epa..dps de ler isto (claramente passaste uns minutos valentes de volta disto), começo a achar o meu blog patético. aaaahhhh!
    tres bien meu sonhor. belissimo ensaio! acho q o saramago deveria ficar c inveja ;)
    ***

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